Este mês estreia a quarta temporada de Orange is the new black, uma das primeiras séries produzidas pela Netflix. Sucesso absoluto no mundo, a série garantiu 6 Globos de Ouro, além de outros 43 prêmios e 88 indicações. O sucesso é reconhecido nos primeiros episódios: o ambiente restrito de um presídio, personagens diversas e suas histórias pessoais se confrontam com senão todas, a maior parte das questões que cercam – e cerceiam – o universo feminino.

Piper Chapman (Taylor Schilling) é uma mulher branca, de classe média, condenada a 15 meses de prisão por transportar drogas a pedido de sua namorada anos antes, que então fazia parte de uma rede de tráfico internacional. Hoje estabelecida, morando com namorado Larry (Jason Biggs), já no primeiro episódio é levada ao cárcere e se choca com sua nova realidade e moradia. Junto a ela estão diversas encarceradas por crimes que conheceremos depois, assim como uma pincelada sobre suas vidas fora daquele ambiente, quem elas eram e são e o que representam para além dos uniformes laranjas.

Estes retratos se tornam complexos à medida que se desenvolvem os episódios, tornando seus personagens reais para o espectador. Ao mesmo tempo, cada um, à maneira de suas individualidades, cria empatia e afastamento a quem assiste, lhes dando a possibilidade não tanto de julgar, mas compreender quem são e o que representam em um universo em que o feminino se apresenta para além da definição tradicional de seu gênero. Não se trata de santificar mulheres ou passar a mão sobre suas cabeças pelos crimes cometidos, mas entender as circunstâncias dos acontecimentos e vivenciar aquela condenação e sociedade em microcosmo ali estabelecida.

Ao mesmo tempo, não é só de mulheres que é feita a série e os personagens masculinos estão de acordo com o que a ficção se propõe. Aqui eles são os parceiros de vida, maridos, carcereiros, psicólogo e diretor. É também surpreendentemente criativa, por desenvolver situações novas a cada episódio, com tantas restrições de hábitos e locações.

A série ultrapassa a dimensão de uma protagonista heroína que dominará o espetáculo a partir da qualidade do elenco e enredo, de tal forma que nem sempre precisamos acompanhar Piper, mas entender o que está acontecendo com sua ex-namorada Alex (Laura Prepon), com aquela que é transexual, com a que foi estuprada, com a que está grávida, com a que se relaciona com outra mulher, com as imigrantes, com as viciadas, com as enfermas, com as idosas.

 

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Dentre todas as bandeiras levantadas na série de forma a não cansar o espectador, mas em diálogos trazendo as realidades das carências, desigualdades e defesas das mulheres desta ficção, há sempre o contraponto com a realidade. Talvez não seja forte demais definir a série como feminista e a própria busca por elementos que descaracterizariam como tal é um desafio. Mas ela não se encerra aí, há toda a questão do sistema carcerário, questões raciais, definição de gênero, machismo, violência e, por fim, a sociedade americana em xeque.

A criação de Jenji Kohan, experiente tanto em ficção como em personagens e femininas (criadora de Weeds, roteirista em Sex and the City, Gilmore Girls, Will and Grace), garante qualidade. Há uma bandeira subliminar – parece ser tão óbvia que o subliminar não seja possível, mas o entretenimento ainda é sua marca maior – sendo levantada em meio a essa comédia dramática, por mais estranha que seja essa catalogação. Ou talvez bandeira não seja o melhor dos termos, mas o roteiro e seu desenvolvimento provocam alguns questionamentos e perceber que as mulheres, ainda que ali – e infelizmente não apenas na ficção – estejam em desvantagem, elas lidam com seu cotidiano e o subvertem para, no mínimo, se fazerem ouvidas.

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