Não é apenas o currículo invejável que faz de Andrea Alvares uma mulher excepcional e inspiradora. Com poucos minutos de conversa já é possível perceber que ela não é uma pessoa que se deixa abalar por estereótipos femininos. Passa uma postura forte, mas, ao mesmo tempo, amigável. E, ao Plano Feminino, ela confessa: “nunca me vi no papel de mulher versus homem no trabalho. Sempre tratei todos de igual para igual”.
Há 14 anos na Pepsico, hoje Andrea é diretora geral da categoria de Salgados para a América do Sul e Central, área em que coordena diretamente 15 executivos do alto escalão. Antes de assumir o cargo que tem hoje ela ocupou a posição de diretora geral do Negócio de Snacks na Pepsico Brasil, sendo responsável por marcas como Lay’s, Ruffles, Doritos, Cheetos e Torcida, assim como a posição de presidente da PepsiCo Brasil Bebidas. Em seu currículo também consta nada menos do que sete anos na Procter & Gamble (P&G).
Mas seu dia a dia está longe de ser apenas na Pepsico. Além de ter três filhos, ela ainda participa é vice-presidente do Conselho Administrativo da Amcham, membro do Conselho Estratégico da Rede das Mulheres pela Sustentabilidade do Ministério do Meio Ambiente, do Conselho Deliberativo do Instituto Ethos e do Conselho Consultivo do Instituto Akatu. Em 2013 e 2014, foi eleita uma das dez melhores gestoras de empresas do Brasil, de acordo com ranking Egon Zehnder e Valor Econômico.
Andrea falou com o Plano Feminino durante o Global Summit of Women, um evento de negócios voltado para mulheres do mundo todo que aconteceu pela primeira vez no Brasil este ano. No fórum, ela foi uma das palestrantes no painel sobre marca pessoal e deixou seu recado: as mulheres precisam apontar mais o que elas fazem, seus feitos e conquistas.
Veja a entrevista com Andrea na íntegra:
Plano Feminino: Andrea, como foi para você lidar com um ambiente executivo predominantemente masculino?
Andrea: Até pouco tempo atrás eu nem lembrava se eu era mulher ou homem, nao era uma questão que influenciava se eu ia me achar capaz ou não de desempenhar alguma área profissional. Acredito que o fato de meus pais sempre terem me criado para ser quem eu quisesse ser ajudou muito. Tanto é que minha dúvida, quando pequena, era se eu seria astronauta da NASA, bailarina clássica ou advogada. Eu nunca achei que o fato de ser menina ou mulher era limitante para aspirar qualquer carreira.
PF: Mas você não sentia que o ambiente era muito masculino?
Andrea: De fato quando eu cheguei a cargos de liderança, a presença feminina é muito menor. Já participei de reuniões que eu era a única mulher em meio a 20 homens.
Mas isso nunca me incomodou. É claro que há ocasiões que a gente não sabe muito lidar, como em eventos sociais. Mas eu sempre criava um contexto para participar das conversas. Lia cadernos de esportes, por exemplo, para não ficar de fora das conversas, mas eu sou uma pessoa naturalmente curiosa, então ler os cadernos de esporte não é um esforço. Nunca percebi nenhuma limitação por ser mulher. Se você tem confiança em si e sabe que tem o direito de sentar na mesa, você senta, se posiciona e as pessoas vão te ouvir. No começo pode ter uma certa estranheza, ainda mais com homens de gerações mais antigas que não estão tão acostumados, mas eles vão percebendo que você tem o que dizer e vão te escutar.
PF: Que dicas daria para que as mulheres consigam também se posicionar?
Andrea: Elas precisam lidar com o problema e não aprofundá-lo. Ser mulher nunca foi um limitante para mim e eu nunca fui preterida por isso, mas sempre foi muito importante deixar claro as minhas intenções. Em determinado momento da minha vida eu tinha claro que queria ser gerente-geral. Tinha feito Administração de Empresas na FGV e gostava do ambiente de negócios. E eu conversei com meu chefe sobre isso, deixei claro o que eu ambicionava para mim na empresa. Às vezes a gente acha que é natural que nos considere para o cargo, mas não necessariamente. Não é maldade, é status quo e inércia. Deveria ser diferente, mas não é ainda. O seu chefe pode não saber que você almeja aquele cargo e se você não falar ele não vai saber.
PF: Como você vê o homem na sociedade que vivemos hoje?
Andrea: A questão cultural e papel sociais no qual homens e mulheres foram criados ainda é muito forte. A mulher precisa ser educadora, protetora, cuidadora, enquanto o homem foi educado para levar o dinheiro para casa e, se ele se frustrar nessa área, para ele é o fim. Não existe uma forte cobrança para mulheres darem certo em um emprego. Nesse sentido, é fácil entender porque o homem sempre levanta a mão e a mulher não. Ele foi criado para ser agressivo e assertivo. Eu sempre fui muito moleca e acho que isso me ajudou muito, eu sempre achei que podia.
As mulheres precisam querer acreditar e esperar que tenham uma participação maior em cargos executivos, assim como os homens também precisam entender que podem exercer outras funções, como a de pai, marido e filho. Não é só a mulher que tem de representar esses outros papéis. Mas nós temos apoio social, ao contrário deles. Para muitos, homem que quer ficar em casa para cuidar do filho e ‘banana’.
Profissional X Pessoal
PF: Muito se fala da busca do equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Como você lida com isso?
Andrea: Eu tenho três filhos, fui casada por 15 anos e estou divorciada há quatro. Sempre trabalhei bastante e para lidar com todas as esferas eu aprendi, primeiramente, a abrir mão da culpa. Ficar se flagelando ao achar que não é boa mãe ou boa profissional além de ser agonizante, não traz nenhum benefício. Eu entendi – e precisei da terapia para isso – que não há escolhas boas e más. Tenho de aceitar as consequências das escolhas que eu mesma fiz. Abrir mão da culpa foi o primeiro grande passo para ser mais livre. A perfeição não é algo que eu aspiro. Em segundo lugar, contar com uma rede de apoio também é importante, seja marido, baba, familiares ou amigos que te ajudem. O fato de eu ser muito disciplinada também ajuda muito.
PF: E você acha que consegue equilibrar bem essas esferas?
Andrea: Eu não me cobro o equilíbrio diariamente. Eu posso ter dias desequilibrados e outros que eu consigo cuidar melhor dos meus filhos. A ideia é que no fim eu tenha compensado os dias exaustivos no trabalho e sentir que consegui exercer os papéis de forma satisfatória, com qualidade em cada um.
PF: O que mudou na sua vida profissional quando você se tornou mãe?
Andrea: Eu acredito que sou uma melhor profissional depois de ter se tornado mãe. Não que eu não aprendesse isso sem ter sido mãe, mas a maternidade provocou algumas mudanças em mim que também influenciaram minha vida profissional. Exemplo: fiquei mais paciente, aprendi a delegar mais e entender que não controlamos tudo, aprendeu a ter mais empatia e me colocar no lugar do outro.
Pepsico e as mulheres
PF: Como a Pepsico estimula a ascensão de mulheres aos cargos de liderança?
Andrea: Reconhecer que a diversidade é importante, independente de gênero. Isso faz parte da agenda estratégica da Pepsico, tentar entender como a diversidade agrega para tomada de decisões e influencia nos negócios. Temos programas que visam assegurar que essa adversidade seja respeitada, ouvida e tenha espaço para amadurecer dentro da organização. Entendo que estamos em um processo de mudança. Olhando para a mulher e como ela está subrepresentada, traçamos metas e programas que, a longo prazo, instituem na empresa a representatividade de mulheres em cargos de liderança.
Entendemos que muitas mulheres deixam a vida profissional quando estão em cargos de média gerência porque seu interesses pessoais acabam concorrendo com a vida pessoal. As escolhas ficam mais difíceis se não há flexibilidade do outro lado. Neste momento, saída e retorno da gravidez perdemos muitas profissionais. Assim, criamos programas focados em assegurar a retenção neste momento. Além dos 6 meses de licença maternidade, damos a opção de trabalho e horários flexíveis em algumas funções, homeoffice. Isso faz parte de um programa que chama Doce Começo.
Além disso, instituímos programas de mentoria com líderes mais seniores. Não é um programa exclusivo para mulheres, mas acaba suprindo uma falha que percebemos: os homens costumam fazer mentorias informais e as mulheres não, muito porque não há tantas líderes mulheres.
Nós também criamos há dois anos um programa de desenvolvimento de mulheres líderes executivas, que é ministrado em uma semana por professores de Harvard para falar sobre decisões, escolhas, desafios e passar um bom conteúdo analítico-estratégico.
Por fim temos as Roundtables que é um projeto qeu a operação do Brasil está liderando. A ideia é promover um bate papo sobre carreira entre mulheres. Eu mesma já participei de alguns cafés do tipo. Estamos pensando em abrir para homens participar também agora.
PF: Qual sua mensagem final para as mulheres que almejam serem líderes?
Andrea: Eu nunca pensei muito nisso, mas, há quatro anos, o assunto virou uma agenda muito mais observável porque cheguei à conclusão que precisávamos falar do assunto. Há muito ainda o que mudar e, se não falarmos disso, vai demorar muito mais. Não é uma briga de homens versus mulheres, é a sociedade que precisa mudar para que todos tenham vidas mais plenas.