Quando minha amiga me deu “Comer, amar, rezar” de presente, meu ex-marido tinha acabado de pedir a separação. Com um detalhe: era o dia do meu aniversário. Não preciso nem comentar sobre a ‘sensibilidade’ do sujeito e acho que foi por isso que me identifiquei instantaneamente com a história de Elizabeth Gilbert. Além dos processos de separação e ex-maridos problemáticos, tínhamos em comum o gosto pela meditação e pela ioga.
Devorei o livro em apenas uma semana e pelo visto não fui apenas eu quem se identificou, já que “Comer, amar, rezar” vendeu mais de 4 milhões de cópias em todo o mundo. É incrível como alguns autores têm o poder de falar diretamente com o leitor, como Liz, o que faz com o que o livro pareça uma conversa íntima ou uma confidência entre amigas. Em “Comer, amar, rezar” a gente viaja junto com a Elizabeth Gilbert, torce contra seu ex-marido, vivencia suas experiências, admira sua coragem.
Foi justamente por isso que resolvi enfrentar filas intermináveis e sessões lotadas para assistir à estreia no cinema. E fui sabendo que seria inevitável comparar o livro ao filme.
A adaptação de uma obra literária para o cinema não pode ser vista como ‘fiel’ ou ‘literal’, porque são dois meios completamente diferentes. Mas posso afirmar que onde a imagem cinematográfica pode cumprir melhor as possibilidades do livro é no que ele se refere como visual. De fato, o filme cumpriu muito bem o seu papel ao mostrar várias descrições relatadas no livro durante a jornada de Elizabeth Gilbert pela Itália, Índia e Indonésia. Mas a principal viagem ficou perdida entre tantas paisagens: a busca interior da escritora. Porque a mais fascinante e recompensante jornada de todas é a viagem para dentro de nós mesmos e, cá entre nós, não é preciso ir ao exterior para fazer isso.
Se você já leu o livro, o filme torna-se dispensável. Se não leu, vai achar até interessante assistir a “Comer, amar, rezar”. Mas, com certeza, mais interessante ainda será ler a obra. Fica a dica.
Em tempo: Como afirmei, as referências visuais presentes em um livro são bastante úteis à narrativa cinematográfica, uma vez que a descrição visual é uma característica intrínseca à linguagem fílmica. Entretanto, o cinema possui muitos outros recursos para tentar produzir no espectador efeitos semelhantes aos que a narrativa literária pode criar no leitor.
A montagem cinematográfica exerce uma tripla função: criadora de movimento, de ritmo e de ideias. O ritmo nasce da sucessão de planos, seguido pelas ligações de continuidade e de expressão. Os diferentes planos e angulações podem criar sensações diferenciadas. A câmera subjetiva, por exemplo, faz o expectador ver o que o personagem está vendo. Ela carrega as emoções do personagem, fazendo o espectador participar da ação, efeito parecido ao que pode ser criado pela narrativa em primeira pessoa.