Deus me livre me apaixonar, disse uma amiga. Apaixonar é ficar burra, disse a outra. Nunca mais namoro, não quero me relacionar porque dá muito trabalho, decretou a terceira.
Acho bonito se apaixonar, disse eu.
Elas riram, fizeram o sinal da cruz, saíram correndo dali.
E nisso caí em mim. Quando estive apaixonada pela última vez? Anos, sem dúvida. De lá pra cá, casinhos, paixonites, vontadinhas, os famosos crushes que a molecada gosta de falar no Twitter. Mas paixão, aquela que tira o sono e ao mesmo tempo faz acordar sorrindo, com olheira de uma noite de amor ou de sonhos de amor? Anos e anos. A ponto de me fazer duvidar: será que um dia vou me apaixonar de novo? À beira dos 40, vida já meio encaminhada, carreira, tudo. Será que vou me sentir assim novamente, dando risadinhas adolescentes ao lembrar de uma voz bonita, um café da manhã na cama ou um sorriso vindo do outro lado da sala?
Eu me apaixono por projetos, por amigos queridos, pela perspectiva de fazer algo novo.
Não me entendam mal: eu me apaixono por projetos, por amigos queridos, pela perspectiva de fazer algo novo. Me encanto com um restaurante com comida boa, me emociono ao ver filmes tristes, dou risada quando uma amiga faz uma piada boba, fico tristíssima ao ver uma criança morando na rua. Eu sou capaz de amar, sem dúvida. A emoção existe aqui, a empatia, a raiva, a tristeza, a felicidade e a compaixão estão presentes. E cadê a paixão romântica?
Que geração é essa de mulheres que não se apaixonam?
Eu e minhas amigas não nos apaixonamos mais. Mulheres bonitas, inteligentes, com carreiras diversas, com mais de 30 anos. Não nos apaixonamos por escolha, por medo, por falta de encontrar alguém significativo. O que vêm acontecendo conosco? Que geração é essa de mulheres que não se apaixonam? O que anda passando por nossas cabeças e corações?
A aparente oferta de pessoas disponíveis cria uma ilusão perigosa: se envolver e apaixonar por quê?
Pessoalmente, culpo os novos tempos. Em época de amores líquidos e aplicativos que transformam a paquera em um grande álbum de figurinhas, é jogo duro se aproximar e criar algo significativo com alguém. É difícil investir tempo em conhecer alguém profundamente, e a aparente oferta de pessoas disponíveis cria uma ilusão perigosa: se envolver e apaixonar por quê, se posso ter um amor diferente por semana?
Nada contra relacionamentos casuais e transas de uma noite. Isso é possível e faz parte do enorme rol de tipos de relacionamentos que existem hoje. Mas é APENAS isso? A quantidade de amigas que vivem essa sucessão de namoros-de-uma-noite-só é grande. Eles parecem suprir nossa carência, mas algumas vezes, depois que a pessoa vai embora ou você entra no táxi, vem um vazio, uma solidão que pode ser até maior do que se estivéssemos de fato sozinhas.
Como conseguir se apaixonar de novo? Vejam bem, eu não sei.
Como conseguir se apaixonar de novo? Vejam bem, eu não sei. Não faço idéia, mesmo. Se soubesse, talvez estivesse ocupada escolhendo um prato legal pra fazer no jantar a dois ao invés de escrever um monte de questionamentos. Mas pensei nisso e me deu uma vontade muito grande de amar de novo, de amar alguém. Talvez porque eu finalmente tenha conseguido amar a mim mesma, olhando no espelho e pra dentro de mim mesma e gostando do que vejo, esteja achando que seria muito bom amar alguém. Talvez porque o inverno esteja se aproximando e seja muito bom dormir junto no frio. Talvez porque eu esteja ficando velha e um bocado cansada de encarar a vida sozinha. Não sei.
Mas quero sentir de novo aquela comichão no peito, o frio na barriga, a alegria de ver a pessoa por cinco minutos que sejam. E tenho a sensação de que pode acontecer em algum momento. Eu acho bonito se apaixonar.