A experiência de ser pai de uma menina transformou a minha vida. Claro que o nascimento de um filho, em menor ou maior escala é um fato transformador, mas no meu caso foi isso que aconteceu, literalmente. Eu, que nunca havia lavado um prato, por ironia do destino, hoje ganho a vida falando de equidade de gênero. Tudo por conta do aprendizado que tive de criar uma menina. Acredito que se eu tivesse criado um menino, não estaria aqui contando essa história.
Eu não sabia, mas tinha uma cabeça muito machista. Claro que amava minha filha e até procurava “ajudar” (e não compartilhar de verdade) minha esposa no cuidado da Luiza. Ficava todo orgulhoso quando contava para os meus amigos que eu revezava com ela para darmos a mamadeira da madrugada, pois minha mulher não tinha leite. Trocava uma fralda de vez em quando. Mas eu trabalhava muito e achava que a função de pai era colocar um prato de comida na mesa, acima de tudo.
Quando a Luiza fez três anos e meio, todos nós mudamos de país e eu precisei ficar em casa para cuidar dela e da casa. Eu aprendi a cozinhar porque minha filha precisava levar almoço na escola. Aprendi a desembaraçar seus cabelos (hoje ela cresceu, como eu sinto falta das horas que eu passava fazendo isso). Aprendi a importância de elogiarmos nossos filhos – e corrigi-los quando necessário. Mas, principalmente, aprendi que ser pai é mais do que prover o sustento dos nossos filhos: é sobretudo dar carinho e afeto e estar ao lado deles sempre que possível.
Nesse período que fiquei em casa, fui um privilegiado. Tive a oportunidade de ficar ao lado da minha filha, todos os dias, durante 1.005 dias ininterruptos. Qual pai ou mãe tem esse privilégio? Eu não conheço ninguém. Hoje, cada vez que preciso me ausentar de casa por um período longo, sinto a mesma culpa que persegue cada uma das mães que trabalham e não podem acompanhar seus filhos tão de perto o tempo todo.
Sem contar que passei por coisas que jamais imaginei na minha vida: troquei receita de bolo com as outras mães da escola, levei minha filha a um barzinho às 11 da noite porque não conseguia fazê-la dormir, quase fui preso quando tive que levá-la a um banheiro feminino, enfim, tive muita história para contar. Tantas, que acabei escrevendo um livro.
Hoje ela cresceu, completou 10 anos. Já não quer pegar na minha mão toda hora, não quer mais assistir televisão deitada na minha barriga, nunca mais me falou “pai, como você está bonitão hoje”. Mas somos, até hoje, companheiros inseparáveis, criamos um vínculo maravilhoso, que me realiza como pai e como ser humano.
Criar minha filha tão de perto me permitiu ver também como o machismo entra muito cedo na vida das meninas e continua fazendo estragos com o passar do tempo. Certo dia, resolvi que eu tinha que fazer alguma coisa sobre isso.
Quero que minha filha possa andar tranquila na rua, não seja assediada dentro do transporte público, da escola, da universidade. Quero que ela tenha direito a oportunidades iguais e seja tratada com dignidade onde quer que ela vá.
Obrigado filha, por me fazer enxergar tantos comportamentos errados que estavam à minha volta. O mínimo que eu posso fazer em retorno, além de continuar te dando todo o meu amor e estar ao seu lado sempre que você precisar, é brigar por um mundo com mais respeito e justiça para você e todas as mulheres.
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